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A diferença que faz um prato de comida
28
Set
2008
28 - Set - 2008



MAPUTO, 26 Setembro 2008 (PlusNews) – Sexta-feira é dia de festa no Centro Nutricional da Comunidade Sant´Egídio: é dia de comer frango.

Pode não parecer muito, mas para as 1.130 crianças atendidas pelo Centro, ter frango no prato é motivo para comemorar. A maioria das crianças é vulnerável, de famílias pobres e não raro órfãs. Algumas são seropositivas.

“Só de olhar para a criança você vê que ela é necessitada. Elas geralmente chegam aqui sem chinelos, com as roupas rotas e sujas. Todas elas vêm de famílias carentes”, diz Agustinha Cuamba, que começou a trabalhar no programa em Maio deste ano.

A iniciativa existe desde 2000, mas só atendia 300 crianças e em apenas um horário. Também não havia um sistema de identificação, o que tornava difícil controlar o número de crianças, ausências e duplicações.

Há três anos, entretanto, o Centro, que fica na região da Matola, na periferia de Maputo, passou a ficar aberto o dia todo, de segunda a sexta-feira. Foi também desenvolvido um mecanismo mais organizado de admissão e controlo.

“Alguém tem que trazer a criança para fazer a inscrição. Temos que saber onde a criança nasceu, onde vive, quem são os responsáveis por ela. E cada criança é identificada por um número. É o dono do número que recebe a refeição”, diz Lídia Lisboa, uma das responsáveis pelo Centro.

Ela continua: “Lógico que se aparecer alguma criança com fome nós não vamos mandar embora. Mas para continuar no programa ela precisa de fazer a inscrição.”

O sistema também alerta caso a criança não tenha aparecido por alguns dias, para que uma equipa vá até a sua casa verificar o que aconteceu.

Mãos limpas e comida quentinha

Mesmo com o constante entra-e-sai e a algazarra no pátio e no refeitório, o sistema funciona com eficiência. A criança chega e diz o seu número de identificação. A equipa de registo confere a foto no computador, onde também constam a sua idade, peso e altura, e autoriza a entrada.

Antes de correrem para o refeitório, todas as crianças fazem uma parada obrigatória para lavar as mãos, como foram ensinadas. Somente depois de estarem com as mãos limpas elas vão ao refeitório, onde recebem uma refeição quentinha.

O refeitório lota em determinados períodos, principalmente na entrada e saída do horário escolar. Muitas crianças passam no Centro para comerem antes das aulas. Outras fazem o caminho inverso, geralmente com amigos ou irmãos.

Felizarda Luzacumbe, 13 anos, foi inscrita no programa por sua mãe há dois anos. Desde então, todos os dias antes de ir para a escola, a adolescente e seus três irmãos menores, já de uniforme, param no Centro para almoçar.

“A comida aqui é boa. O que eu mais gosto de comer é ovo”, diz Felizarda, dona do número 88.

Faustino Aida Massango, de 13 anos, já participa do programa há quatro anos, trazido pela mãe. Ele, tal como os seus quatro irmãos, também recebe a sua refeição antes de ir à escola.

“Gosto mais de carne de frango. Em casa a gente come pouca carne”, diz o menino, que quer ser jogador de futebol.

A refeição é interrompida por conversas e brincadeiras, mas mesmo assim nunca sobra comida no prato. Depois de brincarem um pouco no pátio, Faustino e seus amigos vão juntos à escola, de barriga cheia.

A idade-limite do programa é 14 anos e muitas crianças crescem recebendo as suas refeições no Centro Nutricional. “Os mais velhos geralmente ajudam a servir a comida aos mais novos, como eles foram ajudados quando menores”, diz Lisboa.

Crianças seropositivas

As refeições têm um efeito especialmente importante para as 20 crianças seropositivas que frequentam o Centro e cuja condição não é revelada aos colegas.

Aquelas que ainda não precisam de tratamento encontram no Centro refeições que podem fazer a diferença na manutenção de sua saúde.

Para as crianças seropositivas já em tratamento, uma alimentação saudável já é meio caminho andado para uma terapia bem-sucedida, já que os antiretrovirais devem ser sempre acompanhados de alimentos.

“Aqui elas recebem uma alimentação adequada para o tratamento antiretroviral: comem carne e ovos duas vezes por semana e frutas todos os dias”, diz Cuamba.

Segundo Lisboa, as crianças que precisam de nutrição especial recebem os alimentos no centro de atendimento infantil na Machava, também mantido pela Comunidade Sant´Egídio.

“Mas elas podem continuar a comer aqui todos os dias”, diz.

Muito além da comida

Mais do que acabar com a fome, as refeições proporcionadas diariamente a essas crianças têm um impacto sobre outras áreas de suas vidas e famílias.

Barriga cheia, por exemplo, tem uma relação directa com a escolaridade.

“Muitas crianças desistiam de ir à escola, porque não tinham nada para comer. Fome é fome”, diz Lisboa. “Aqui elas têm um sítio onde recebem um prato completo e de barriga cheia, elas ficam na escola.”

É também através do Centro Nutricional que muitas crianças recebem um registo civil e passam a existir legalmente.

“Muitas crianças que vêm se inscrever não têm registo de nascimento. Sem esse registo, elas não têm direito a benefícios do governo, como escola”, explica Lisboa.

Nesses casos, a equipa do programa leva os pais para providenciar um registo civil para a criança. Depois disso, a criança é registada numa escola.

As refeições gratuitas também ajudam as próprias famílias.

“Muitas famílias vivem de pequenos negócios, ou biscates, ou trabalham na machamba”, diz Cuamba. “Com menos um prato a ser dado em casa, o valor fica reservado para outra coisa.”

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