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Comunidade de Sant Egídio aplica 500 mil euros na construção de centro de tratamento na Beira
14
Dic
2011
14 - Dic - 2011



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Luta contra Sida

* Capacidade de atendimento vai passar dos actuais sete mil para cerca do dobro de doentes
* 1.300 crianças vulneráveis, incluindo meninos da rua, vão beneficiar de almoço diário

A Comunidade de Sant Egídio dispendeu cerca de 500 mil euros na construção de um centro de tratamento de doentes padecendo de HIV/Sida e uma creche anexa para crianças vulneráveis, na cidade da Beira. A infra-estrutura deveria ter sido inaugurada a 1 de Dezembro corrente, Dia Internacional de Luta Contra a Sida, mas tal não aconteceu porque houve um atraso na conclusão das obras. Assim sendo, a inauguração deverá ocorrer em Fevereiro de 2012. Com a entrada em actividade das novas instalações, irá aumentar quase para o dobro o número de atendidos, que é hoje de sete mil pessoas, no centro da comunidade que funciona num edifício anexo ao Centro de Saúde de Chingussura. Na creche serão servidas cerca de 1.300 refeições por dia (almoço) para crianças vulneráveis, incluindo os chamados meninos de rua.
Entrevistada pelo “Diário de Moçambique”, Paola Germano, directora executiva do Programa Dream da Comunidade de Sant Egídio, disse que o funcionamento do novo centro, em construção na baixa da cidade da Beira, irá descongestionar o da Manga, cujo espaço se mostra bastante exíguo para tanta solicitação de doentes.
“A ideia é aumentar a capacidade de tratamento, porque o centro da Manga já não consegue atender às solicitações de novas pessoas que necessitam de assistência. No centro em construção, no primeiro piso ficará a parte da saúde e na parte de cima funcionará um laboratório de biologia molecular, sempre para o tratamento da Sida”, explicou.
Paola Germano referiu que a ideia de edificação do novo centro foi discutida com as estruturas da Saúde na província de Sofala e enquadra-se nos acordos de cooperação entre a Comunidade de Sant Egídio e o Ministério da Saúde.
Ela reiterou que a obra integra uma parte que vai tratar da questão da saúde (tratamento dos doentes) e outra que comportará o aspecto social (creche).
Sublinhou que a creche será um lugar para as crianças mais pequenas que ainda não estudam e cujas mães não têm com quem as deixar quando vão para as suas actividades diárias e, por isso, ficam na rua. “Muitas vezes as crianças mais crescidas, de 7 a 8, anos não conseguem ir para a escola porque têm que tomar conta das mais pequenas. Com a creche isso vai deixar de acontecer. Elas (crianças mais pequenas e as mais crescidas) encontram-se no centro à hora do almoço, ficam juntas e depois de comer voltam para suas casas. Também haverá actividades recreativas, escolares (aprendizagem socioprofissional). Também as crianças da rua irão beneficiar deste projecto”, salientou Paola Germano.
Ainda em relação à edificação da obra, a fonte indicou que a parte da creche custou 150 mil euros, doados por um cidadão italiano (não citou o nome), cuja esposa faleceu com idade avançada e vítíma de doença. “Ele doou o dinheiro para ajudar crianças africanas”, frisou.
Acrescentou que o centro será sustentado por fundos provenientes de um prpgrama de adopção de crianças à distância. “Não se trata de uma adopção individual, mas sim colectiva. Cidadãos italianos e de outros países da Europa vão oferecer por mês uma determinada quantia, por volta de 20 euros, que será canalizada para a Comunidade de Sant Egídio e usada para as despesas com as refeições e pessoal do programa”, disse a nossa entrevistada.
A componente da saúde, tratamento dos doentes, segundo a nossa interlocutora, é financiada por fundos do Programa Dream em Moçambique, com a participação de parceiros de vários países, Conselho Nacional de Combate à Sida e Ministério da Saúde, que disponibiliza os medicamentos.
“Neste momento a Comunidade de Sant Egídio assiste, no Centro de Reabilitação de Chingussura, cerca de sete mil doentes e fazemos uma abordagem holística no tratamento. Não é só entrega de medicamentos. Também é entregue aos doentes um pacote nutricional, providencia-se assistência social e domiciliária”, disse Paola Germano.
Por sua vez, Matias António Simbe, coordenador social no Centro de Reabilitação de Chingussura, explicou os passos seguidos após a recepção do paciente. Disse que depois de feito o diagnóstico e verificar-se que a pessoa está bastante mal, ela tem direito à assistência domiciliária. Recebe o pacote alimentar, para poder suportar os antiretrovirais que deve tomar.
“Acompanhamos o doente até à sua casa e fazemos o seguimento diário da sua rotina, desde o controlo da toma de medicamentos até à evolução do seu estado”, referiu.
Perguntamos à fonte como é que os doentes chegavam ao centro. Como resposta, Matias Simbe disse que são levados pelos familiares, “como resultado das boas informações sobre o bom tratamento que as pessoas recebem aqui no centro”.
Em relação a este aspecto, Paola Germano destacou que no início era diferente. Foi difícil porque, verdadeiramente, só chegavam ao centro para tratamento aqueles doentes que estavam em fase terminal da doença, quase a morrer.
“Alguns deles chegavam transportados em carrinhos de mão (daqueles usados nas obras) porque não tinham forças sequer para andar. Depois de muitos anos de trabalho, aqui no centro, depois de campanhas de sensibilização e explicação e o testemunho de activistas e outros doentes com coragem, isso tudo no ano de 2003, quando inaugurámos o Centro de Chingussura, é que as coisas melhoraram e hoje toda a gente já procura o tratamento, sem tabus”, frisou.

OBJECTIVOS DO PROGRAMA

A directora executiva do Programa Dream, disse que o objectivo principal do programa de luta contra a Sida é, sobretudo, salvar ou ajudar as mães grávidas. “É claro que a necessidade de tratar a Sida é muito grande mas é preciso ter um objectivo prioritário. O nosso objectivo de início foi de tratar as mulheres grávidas e fazer o tratamento para elas e para as crianças (transmissão vertical). Isto é muito importante porque alguns preferem tratar só a criança. O problema é que depois ela fica órfã e os órfãos custam muito ao Estado e à sociedade”, explicou.
A fonte avançou que, no novo centro, a primeira coisa que se pretende é receber o maior número possível de mulheres grávidas, “porque queremos que no futuro haja uma geração sem Sida. Este é o objectivo”.
Ela destacou que “nunca foi uma abordagem de só tratar apenas a parte técnica da Sida, como seja a colheita do sangue, fornecimento de medicamentos, consultas. Nós temos dito e achamos que tem que se trabalhar de maneira a que os próprios doentes se tornem protagonistas do programa. Isto é importante porque faz a diferença”, sublinhou.
À pergunta de que maneira faz a diferença, ela respondeu que “porque depois de um tempo, o doente, depois de tomar os medicamentos, melhora o seu estado de saúde. Então, ele deve ser envolvido no programa, tem que ajudar a receber os outros doentes, fala com eles e passa a faze parte de uma rede comunitária. O programa não pode funcionar se não tivermos pessoas na base para dar assistência domiciliária aos doentes, que falam com as famílias, ajudam os doentes na luta contra o estigma e tudo o que seja prejudicial”.
Paola Germano comentou de seguida que “isto é uma parte muito importante, porque se fala muito de taxa de abandono de doentes de Sida. Abandonam porque têm problemas sociais, porque uma mulher chega a casa e não pode tomar os medicamentos na frente do marido porque tem medo que ele a abandone ou porque se a sogra vê que não amamenta o bebé, vai implicar com ela”.
A nossa entrevistada é de opinião que a parte social da Sida não se pode resolver só com um centro de tratamento de excelência, que faz bem o seu trabalho. Destacou que é preciso um acompanhamento domiciliário e aqui, segundo ela, é importante a participação dos doentes que já iniciaram o tratamento e se sentem bem de saúde.
“Eles devem liderar esta parte, isso ajuda muito a diminuir o estigma, por isso é que dizemos que no início a situação era difícil. Agora chegam ao centro até jovens que querem saber qual é o seu estado de saúde, se são ou não seropositivos e também outras pessoas adultas pedem para fazer o teste. Isto é importante, é uma mudança. Esta acontece quando há testemunho de pessoas que trabalham neste aspecto”, argumentou.
Ela indicou que são realizadas muitas palestras envolvendo todas as mães que precisam de educação sobre a saúde, para cuidarem das crianças e da família, bem como preparar os alimentos e tratar a água para prevenir doenças como malária, tuberculose, etc. “É uma forma de investir na saúde da população. Isto pode fazer-se com a ajuda dos mesmos pacientes que passam a ser protagonistas junto de activistas. Por isso foi criada a Associação Eu Dream, que congrega pessoas doentes ou vivendo com Sida”, afirmou.

CONFISSÃO
DE UM SEROPOSITIVO

Matias António Simbe, é coordenador da parte social do Centro de Tratamento de doentes de Sida que funciona no Centro de Saúde de Chingussura, sob gestão da Comunidade de Sant Egídio. Ele é seropositivo e contou ao “Diário de Moçambique” como tudo começou:
— “Eu estou aqui como paciente. Vim aqui em 2004, sem forças, nem conseguia andar, tinha muletas, vinha de Tete. O Dream me recebeu, deu-me bom aconselhamento, medicamentos e melhorei. Já estou bem e consigo sensibilizar, aconselhar outras pessoas. Já consigo convencer outras pessoas a irem fazer o teste”.
“Eu estava muito mal, estava quase na fase terminal, cheguei a pensar que ia morrer, mas hoje faço parte da Associação Eu Dream. É desse grupo que saem os activistas. Muitos deles são aqueles que saíram desses problemas e que conseguem melhor explicar aquilo que se passou com eles. Por isso, o Programa Dream começa comigo mesmo. Chama-se Eu Dream porque eu é que fui o primeiro a sofrer do problema e hoje já estou bem e também posso conseguir explicar a uma outra pessoa. É desta maneira que nós trabalhamos” — assim terminou Simbe a sua “confissão”.
De referir que Matias Simbe, na qualidade de coordenador social, tem a seu cargo a organização de palestras e educação para a saúde dos doentes, distribuição do pacote nutricional e cuidados domiciliários, no Centro de Reabilitação de Chingussura.

 

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